Um estudo publicado na Revista Cancer Medicine revelou que cada 12 meses de aleitamento materno pode reduzir em 4,3% a probabilidade de desenvolver câncer de mama. “E isso é cumulativo: a cada nascimento, esse risco reduz 7%,” afirmou Maíra Domingues, coordenadora de Assistência do Banco de Leite Humano do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira, da Fundação Oswaldo Cruz (IFF/Fiocruz), em entrevista à Agência Brasil.
A pesquisa apontou que essa redução ocorre em mulheres de diferentes países, rendas, idades, entrada na menopausa, grupos étnicos e idade do primeiro parto. “O que a gente tem são diversas evidências robustas que revelam esse dado de redução do câncer de mama,” explicou Maíra.
O Banco de Leite Humano recomenda, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza, o aleitamento materno exclusivo por seis meses e continuado até dois anos ou mais. “São justamente [com] esses dois anos ou mais [que se] ganha a proteção para o câncer de mama. Muitas famílias perguntam por que é preciso amamentar por dois anos ou mais se o bebê está fazendo alimentação em casa. Porque amamentar vai muito além de alimentar a criança. Amamentar é proteção não só para a criança, mas também para a mulher. Esses benefícios se estendem para ela.”
Além de reduzir o risco de câncer de mama, a amamentação oferece benefícios adicionais para mães e filhos. A mãe pode experimentar uma redução no risco de câncer de ovário, diabetes e doenças cardiovasculares, além de fortalecer o laço afetivo com o filho. Para as crianças, a amamentação protege contra doenças diarreicas, infecções respiratórias, melhora o desenvolvimento orofacial, da linguagem, e reduz o risco de obesidade e diabetes no futuro.
Estudos também indicam que o leite humano contém células-tronco, o que confere um potencial terapêutico significativo. “O fato de o leite humano ter células-tronco mostra o quanto esse alimento tem um potencial enorme, que vai muito além da alimentação da criança.”
Risco Relativo
O mastologista do Hospital do Coração, Afonso Nazário, esclareceu que a redução do risco não é absoluta, mas relativa à população. “Suponha que o risco de certa população, para ter câncer de mama, é de 100 casos para cada 100 mil mulheres. Quando o risco relativo diminui 4%, essa redução é sobre a população geral. Se o risco relativo de câncer de mama aumenta 20%, não é que ela, a pessoa, vai ter 20% mais de risco. É em relação à população geral.”
Nazário afirmou que mulheres que amamentam por pelo menos um ano têm 4% menos risco em relação à população em geral. Se houver um novo parto, essa dimensão aumenta em 7%, resultando em 11%, mas ainda é um risco relativo à população geral. Ele destacou que o efeito protetor é mais significativo em mulheres jovens, abaixo de 35 anos, principalmente abaixo de 25 anos. “Tudo que aumenta o risco, quanto mais jovem a mulher, maior o impacto.”
Se a mulher se torna mãe antes dos 25 anos, o risco relativo de câncer de mama na pós-menopausa reduz em 35% comparado às mulheres que nunca tiveram filhos. Após essa idade, o risco de desenvolver a doença aumenta.
Nazário afirmou que o efeito protetor da amamentação por mais de um ano ocorre inclusive em formas agressivas de câncer de mama, como os tumores triplo-negativos, quando detectados precocemente. O risco pode diminuir em cerca de 20%. Para mulheres com mutações hereditárias BRCA1, a amamentação também reduz a manifestação da doença em 22% a 50%.
Um estudo das universidades federais de São Paulo (Unifesp) e do Amazonas (Ufam) em 2022 revelou que não existe taxa de mortalidade de câncer de mama entre populações indígenas, onde a amamentação dura, em média, cinco a seis anos. “Isso é muito maior do que a população não indígena. É um efeito protetor absurdo,” disse Nazário.
Teorias
Membro da Comissão de Mastologia da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), o médico Guilherme Novita disse que mulheres que amamentam têm menos câncer de mama. Ele explicou que, durante a amamentação, o ovário da mulher fica em dormência, sem produzir os hormônios do ciclo menstrual que podem causar alterações nas células mamárias, favorecendo o surgimento de câncer.
Outra teoria sugere que a amamentação, especialmente em uma fase mais jovem, estabiliza as células mamárias, tornando-as menos suscetíveis a agentes oncológicos ambientais. Essa teoria, no entanto, é menos aceita.
Benefícios
Novita destacou que os estudos sobre os benefícios da amamentação devem ser analisados com cuidado, considerando as diferenças entre populações rurais e urbanas. Ele afirmou que a amamentação não deve ser promovida exclusivamente para prevenir o câncer de mama, embora reconheça que é um benefício adicional. “O maior benefício da amamentação é a nutrição da criança, ainda mais em um país como o Brasil em que, em alguns lugares, há dificuldade de alimentar. É fundamental para o desenvolvimento e diminuição da mortalidade infantil,” disse Novita.