Hidratação constante e toalha úmida à mão são recomendações da pesquisadora Tatiane Cristina Moraes de Sousa para enfrentar o calor intenso. Professora do Departamento de Epidemiologia do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), ela alerta sobre os impactos que as altas temperaturas podem causar na saúde a curto e longo prazo, como os registrados na cidade do Rio de Janeiro. Nos dois primeiros meses do ano, mais de 5 mil pessoas buscaram atendimento em unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) devido ao calor excessivo, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde (SMS-RJ).
“Quando falamos dos impactos, temos que pensar primeiro na exposição, que é como aquela pessoa está exposta, por quantas horas, se está dentro de um ambiente ou não, se está a céu aberto, trabalhando”, explica a professora. Entre os efeitos imediatos da exposição ao calor, ela destaca sinais de exaustão e insolação, que, em casos graves ou sem o devido tratamento, podem comprometer órgãos vitais. “A pessoa pode ter desmaios, náuseas, diferentes sinais e sintomas que mostram que ela está se encaminhando para uma insolação. O risco final, que pode acontecer de imediato dependendo das condições, é a pessoa vir a óbito”, alerta. A pesquisadora relembra o caso da estudante Ana Clara Benevides Machado, que faleceu devido à exaustão pelo calor durante um show da cantora Taylor Swift no Rio de Janeiro em 2023.
Além dos impactos imediatos, Sousa também aponta para os efeitos de longo prazo da exposição prolongada ao calor extremo. Em entrevista à Agência Brasil, ela explica que a sobrecarga térmica exige maior esforço dos sistemas cardiovascular e renal para regular a temperatura do corpo. “Nosso sistema cardiovascular e nosso sistema renal estão se esforçando mais para o nosso corpo voltar à temperatura em que o organismo funciona melhor, em torno de 37ºC, então, se expormos o nosso corpo a esse esforço por um longo período, também aumentamos a chance de aparecerem doenças crônicas”, afirma.
Apesar das temperaturas recordes registradas no Rio de Janeiro — que atingiu uma máxima de 44ºC na segunda-feira (17), a maior desde 2024 —, a pesquisadora ressalta que o calor excessivo é um problema global e requer soluções conjuntas dos sistemas de gestão pública e da sociedade. “Hidratação, por exemplo, é essencial. A prefeitura municipal [do Rio de Janeiro] disponibilizou pela cidade diferentes pontos de hidratação gratuita, mas sabemos que interromper ou evitar essa exposição no horário de 11h às 15h é ideal, só que isso mexe, principalmente, com o trabalhador, isso mexe como construímos a nossa sociedade para os horários de trabalho”, reflete.
Sousa enfatiza que os trabalhadores informais, como entregadores e vendedores ambulantes, são os mais vulneráveis ao calor intenso, devido à dependência dos horários de maior movimento. “Como você vai garantir que esse vendedor não trabalhe nos horários de pico, se no carnaval, por exemplo, é o momento em que eles mais ganham?”, questiona. Além da natureza do trabalho, a idade também é um fator de vulnerabilidade, com idosos e crianças sendo mais suscetíveis a problemas relacionados ao calor. Muitos desses trabalhadores informais apresentam condições pré-existentes, como hipertensão, diabetes, ou doenças renais e cardíacas, que agravam o risco.
Para proteger os trabalhadores mais expostos, a pesquisadora recomenda buscar áreas cobertas e ventiladas, usar chapéus, reconhecer sinais de mal-estar e, quando necessário, encerrar as atividades para buscar socorro. “Essa é uma coisa que o poder público vai ter que intensificar, é o acesso ao socorro, à assistência, o cuidado durante esse período”, reforça. Sousa também sugere refrescar o corpo com água ou toalhas molhadas. Contudo, ela critica a falta de planejamento a longo prazo para enfrentar o problema e defende ações contínuas. “Faltam ações concretas, mas isso não pode parar agora porque estamos no verão. São planejamentos, revisões que temos que ter para o próximo verão, para outros períodos que não imaginávamos que fossem ser tão quentes, mas serão.”