O bairro Eugênia Maria, em Campina Grande do Sul, teve sua origem na “Rua 1”, hoje batizada rua Julio Luvisotto. Considerada a primeira via a surgir no bairro, não à toa que recebeu esse nome. A via acumula muitas histórias de personagens como a de Maria Cristina de Souza, 64 anos – a “Dona Maria” – uma das primeiras moradoras daquela região. Nossa reportagem a encontrou de forma despretensiosa durante uma visita ao bairro.
O primeiro contato do Jornal União com ela foi através de seu esposo, de forma bem-humorada ela se aproximou de nossa equipe e perguntou: qual é o problema? De óculos escuros e um pouco desconfiada, com nossa presença, ela aos poucos foi abrindo o coração e contando um pouco de sua relação com o bairro.
Dona Maria, como popularmente é conhecida, nasceu em Bragança Paulista, interior de São Paulo. Se criou no norte pioneiro do Paraná e residiu por lá até o início da juventude, mais precisamente entre as cidades de Sapopema e Guriúva. Criada na roça, viveu por lá até seus 12 anos de idade – mais ou menos. Quem a criou foi o pai e a madrasta. Sobre a mãe biológica, Dona Maria afirma que ela a abandonou ainda criança e nunca mais ouviu falar dela.
Antes de ir morar na Rua 1, Dona Maria residiu na localidade da Roseira, área rural de Campina Grande do Sul. Segundo ela, quando chegou no Eugênia Maria foi em uma época em que o bairro era “bem humilde”. Não que o bairro deixou a sua essência de lado, nada disso! Existe muita gente simples vivendo ali, mas Dona Maria se refere à infraestrutura, que segundo ela, melhorou e muito de uns anos para cá. “Antigamente não havia asfalto, a casa da gente vivia empoeirada, haja paciência! Tinha um valetão que cortava o bairro, as pessoas não tinham esgoto e o cheiro era muito ruim. Hoje as coisas melhoraram muito, os prefeitos foram dando outra cara pra região”, conta ela.
Não bastasse a precariedade no saneamento básico de antigamente, o entorno da Rua 1 era dominada pela criminalidade, segundo afirma Dona Maria. Ela nos contou que a Polícia e o IML viviam por lá, “pois se matava um por dia”, como ela mesmo descreveu. “Todos os dias tinha um corpo estendido em uma esquina diferente. Foi muito sangue derramado por essas bandas. Ora era alguém do bairro, ora era um cadáver que desovavam por aqui. Atrás de minha casa pipocaram um na presença da mãe e do filho”.
Nesse contexto de crimes com mortes violentas registrados na Rua 1, houve um episódio que marcou a vida de Dona Maria. Seu filho acabou entrando para a estatística dos assassinatos. Em uma emboscada, os criminosos adentraram a residência dele e o mataram a tiros. O caso ocorreu há cinco anos e para uma mãe como Dona Maria , passe o tempo que for, isso nunca mais será esquecido. “Perdi ele pro inimigo”, lamenta. O que ainda a conforta, nesse caso, é que a justiça dos homens está sendo feita, os envolvidos pagam na cadeia pelo crime que cometeram.
Hoje em uma simples caminhada pela Rua 1, é possível perceber que o cenário precário descrito por Dona Maria é coisa do passado. O que tem incomodado mesmo a dona de casa é o lixo acumulado que é deixado não pelos moradores, mas por pessoas de outras localidades. “Todo dia vem carro aqui e joga lixo na beira da rua. Dá a impressão que é a gente, mas não é! Nós cuidamos do bairro como se fosse nossa casa, mas essas pessoas sem noção não deixam”, reclama.
Na mesma rua, Dona Maria já morou em três casas diferentes. Hoje divide o teto além do esposo, com a filha e a netinha. Mesmo tendo parte de sua história enraizada na Rua 1, o maior desejo de Dona Maria é um dia poder mudar de cidade, construir uma nova história em outro lugar. “Já me cansei desse lugar. Se pudesse iria pra outro canto”, conclui.