O número de pessoas trabalhando em aplicativos de transporte e entrega aumenta a cada ano no Brasil. Entre 2015 e 2025, enquanto a população ocupada no país cresceu cerca de 10%, o número de trabalhadores por aplicativos aumentou 170%, passando de aproximadamente 770 mil para 2,1 milhões.
O Banco Central apresentou, nesta quinta-feira (25), cálculos para descrever o impacto desses aplicativos no mercado de trabalho brasileiro, considerando cenários com e sem as plataformas. A análise faz parte do Relatório de Política Monetária referente ao terceiro trimestre de 2025. De acordo com os resultados, o fenômeno dos aplicativos impactou a taxa de participação na força de trabalho, o nível de ocupação e a taxa de desocupação.
Em um dos exercícios do relatório, foram avaliados cenários assumindo que os aplicativos não existissem. A análise sugere que os trabalhadores poderiam enfrentar três situações: buscar emprego sem sucesso e, assim, engrossar o contingente de desempregados; não procurar ocupação e ficar fora da força de trabalho; ou uma situação intermediária, em que parte dos trabalhadores encontrariam emprego e outra parte não. Em qualquer um dos casos, os níveis de ocupação seriam prejudicados. A taxa de desemprego, hoje em 4,3%, poderia aumentar entre 0,6 e 1,2 ponto percentual, atingindo até 5,5% sem a presença das plataformas.
Outro exercício analisou a relação entre o crescimento dos aplicativos e a evolução do nível de ocupação. O Banco Central concluiu que as plataformas digitais não retiraram trabalhadores de outras ocupações. A maioria dos profissionais já estava fora do mercado de trabalho antes de ingressar nesse modelo. “O advento do trabalho por meio de plataformas digitais representa uma mudança estrutural no mercado de trabalho, que contribuiu para o maior ingresso de pessoas na força de trabalho e na ocupação, com efeitos positivos sobre os principais indicadores. O crescimento extraordinário da quantidade de trabalhadores por aplicativos resultou em elevação do nível de ocupação e da taxa de participação, além de uma redução da taxa de desocupação”, apontou o documento.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) indicam que, apesar do crescimento significativo, a participação dos aplicativos no mercado de trabalho permanece pequena. Entre 2015 e 2025, o percentual de motoristas e entregadores passou de 0,8% para 2,1% da população ocupada e de 0,5% para 1,2% da população em idade de trabalhar (14 anos ou mais).
Desde 2020, o transporte por aplicativos passou a ser considerado no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), utilizado para medir a inflação. Em agosto de 2025, o peso do subitem “transporte por aplicativo” no índice foi de 0,3%, enquanto o subitem “passagem aérea” teve peso de 0,6%. “O uso de aplicativos de telefone e internet para contratação de serviços de transporte pessoal e de entrega surgiu cerca de uma década atrás e, desde então, tem crescido e se tornado relevante para a economia brasileira”, afirma o Banco Central.
Entretanto, o trabalho mediado por aplicativos ainda é alvo de críticas por sua precarização. O Fairwork Brasil apontou que nenhum dos principais aplicativos conseguiu comprovar o cumprimento de padrões mínimos de trabalho decente, como remuneração justa. A pesquisa “Plataformização e Precarização do Trabalho de Motoristas e Entregadores no Brasil”, realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apoia essa visão. Segundo o estudo, o trabalho sob plataformas resultou em jornadas mais longas, menor contribuição previdenciária e redução significativa da renda média.
Entre 2012 e 2015, o número de motoristas autônomos no transporte de passageiros era de cerca de 400 mil, com rendimento médio de R$ 3,1 mil. Já em 2022, quando o total de ocupados se aproximava de 1 milhão, a renda média caiu para menos de R$ 2,4 mil. Além disso, a proporção de motoristas com jornadas entre 49 e 60 horas semanais aumentou de 21,8% em 2012 para 27,3% em 2022. No mesmo período, o percentual de trabalhadores que contribuíam para a previdência caiu de 47,8% em 2015 para 24,8%, segundo o Ipea.